sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Este lado para cima

"nevermind the clouds", arte de Duy Huynh

Que frágil é o amor. Justo ele, que é tão enaltecido, querido, analisado, escrito em mil palavras e cantado em tudo que é tom. Ele é frágil. Não precisa de grandes acontecimentos para se abalar. Às vezes um insight é suficiente para que ele se perca e assim se ache em nãosentido. Ele deixa de ser sentido e ponto. Não vou ficar aqui enchendo linha enumerando as variadas formas em que o amor acaba; Paulo Mendes Campos já o fez com maestria. Prefiro fazer o que me cabe: olhar tranquila. E só. Sempre soube da fragilidade do amor, mas hoje a encaro diferente. Antes eu tanto sabia dela que me agarrava ao amor com unhas fincadas. E vivia na crença de que se eu fizesse tudo, desse tudo e aceitasse tudo, o amor perderia sua cor mutante e ficaria sob o meu controle. Besteira. Agora eu simplesmente aceito a fragilidade. Vai ver por isso agora me apaixono menos vezes, mas amo mais puro. Vivo com gana, com entrega, mas despida daquela ansiedade que teme o fim. Não temo. Deixo fluir. Estando em treinamento (constante, darlings), exercito meu olho para ver beleza na temporalidade das coisas. E aceitando a fragilidade do amor, sinto uma leveza inédita que só traz benefícios. Valorizo mais o amor que sinto, valorizo mais as pequenas delicadezas. Valorizo mais quem está comigo e o que ele traz dele. Valorizo mais o amor amplo e ele, o amor amplo, me deixa mais segura e livre para viver melhor o amor a dois. Valorizo o fato do amor ser frágil e ter acabado todas as vezes que acabou, para me ensinar a amar leve assim. Valorizo os segundos, mas sem tentar segurá-los. Valorizo.

Que frágil e valioso é o amor.
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Paulo Mendes Campos!
O amor acaba
"O amor acaba. Numa esquina, por exemplo, num domingo de lua nova, depois de teatro e silêncio; acaba em cafés engordurados, diferentes dos parques de ouro onde começou a pulsar; de repente, ao meio do cigarro que ele atira de raiva contra um automóvel ou que ela esmaga no cinzeiro repleto, polvilhando de cinzas o escarlate das unhas; na acidez da aurora tropical, depois duma noite votada à alegria póstuma, que não veio; e acaba o amor no desenlace das mãos no cinema, como tentáculos saciados, e elas se movimentam no escuro como dois polvos de solidão; como se as mãos soubessem antes que o amor tinha acabado; na insônia dos braços luminosos do relógio; e acaba o amor nas sorveterias diante do colorido iceberg, entre frisos de alumínio e espelhos monótonos; e no olhar do cavaleiro errante que passou pela pensão; às vezes acaba o amor nos braços torturados de Jesus, filho crucificado de todas as mulheres; mecanicamente, no elevador, como se lhe faltasse energia; no andar diferente da irmã dentro de casa o amor pode acabar; na epifania da pretensão ridícula dos bigodes; nas ligas, nas cintas, nos brincos e nas silabadas femininas; quando a alma se habitua às províncias empoeiradas da Ásia, onde o amor pode ser outra coisa, o amor pode acabar; na compulsão da simplicidade simplesmente; no sábado, depois de três goles mornos de gim à beira da piscina; no filho tantas vezes semeado, às vezes vingado por alguns dias, mas que não floresceu, abrindo parágrafos de ódio inexplicável entre o pólen e o gineceu de duas flores; em apartamentos refrigerados, atapetados, aturdidos de delicadezas, onde há mais encanto que desejo; e o amor acaba na poeira que vertem os crepúsculos, caindo imperceptível no beijo de ir e vir; em salas esmaltadas com sangue, suor e desespero; nos roteiros do tédio para o tédio, na barca, no trem, no ônibus, ida e volta de nada para nada; em cavernas de sala e quarto conjugados o amor se eriça e acaba; no inferno o amor não começa; na usura o amor se dissolve; em Brasília o amor pode virar pó; no Rio, frivolidade; em Belo Horizonte, remorso; em São Paulo, dinheiro; uma carta que chegou depois, o amor acaba; uma carta que chegou antes, e o amor acaba; na descontrolada fantasia da libido; às vezes acaba na mesma música que começou, com o mesmo drinque, diante dos mesmos cisnes; e muitas vezes acaba em ouro e diamante, dispersado entre astros; e acaba nas encruzilhadas de Paris, Londres, Nova Iorque; no coração que se dilata e quebra, e o médico sentencia imprestável para o amor; e acaba no longo périplo, tocando em todos os portos, até se desfazer em mares gelados; e acaba depois que se viu a bruma que veste o mundo; na janela que se abre, na janela que se fecha; às vezes não acaba e é simplesmente esquecido como um espelho de bolsa, que continua reverberando sem razão até que alguém, humilde, o carregue consigo; às vezes o amor acaba como se fora melhor nunca ter existido; mas pode acabar com doçura e esperança; uma palavra, muda ou articulada, e acaba o amor; na verdade; o álcool; de manhã, de tarde, de noite; na floração excessiva da primavera; no abuso do verão; na dissonância do outono; no conforto do inverno; em todos os lugares o amor acaba; a qualquer hora o amor acaba; por qualquer motivo o amor acaba; para recomeçar em todos os lugares e a qualquer minuto o amor acaba."
Paulo Mendes Campos
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Rádio Plutão
dança como bailarina em caixinha de música

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2 comentários:

  1. que lindo tudo isso!
    concordo contigo, iza!
    e por o amor ser assim tão frágil, temos que aproveitar bem cada segundo!
    beijusss e que bom que gostou do desenho =)

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  2. troca boa de desenhos e palavras, bia.
    vou postar o seu vermelho escorregadio em breve... =)
    e simsim, aproveitemos pois.
    beijopáraquedas =)

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