Menos

Duas, três, quatro. Deveriam existir números diferentes para as horas da madrugada, já que elas definitivamente não se encaixam na contagem padrão. Elas se arrastam no silêncio que têm, nos seus quasebarulhos. E eu, que acordo, nada posso fazer a não ser me arrastar com elas. Acordo. Acordo com sede, com a bexiga no limite, com o estômago em lixa, com frio. Acordo enxarcada de suor. Acordo com a mente cheia e a cama vazia. Acordo como se o dia já tão longo tivesse sido pouco e eu precisasse viver mais. Acordo para mais. Acordo para ler André, Fal e Saramago, para fuçar na internet, para assistir ao House, para escrever. Nada de novo. Mas de uns tempos para cá, tenho acordado na repetida tentativa de esquecer. Acordo para tentar esquecer. Algo tolo que existe em mim deve acreditar que ficar atenta na quietude da madrugada vai me trazer o alento do esquecimento. Aí eu vou esquecer cada farpa, cada riso, cada gozo, cada sentido que carrego comigo. E, assim, vazia de mim, vou também esquecer a sensação do saber do fato antes mesmo dele fato ser. Vou esquecer. Pura e simplesmente esquecer. Luti me disse dia desses que queria ser mais máquina e menos mansa. Pois eu queria mesmo era ser mais vapor e menos sentido. Sendo vapor, seguiria pela vida em ares mais bobos, sem tanto sacar, sem tanto saber, sem tanto prever, sem tanto reter. Seguiria mais leve se eu tivesse pouco para esquecer.

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Radio Plutão

pianinho.

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