terça-feira, 21 de junho de 2011

Por que amo a fal

na foto: fal e eu =)

" No fim, a moça da imobiliária e eu fizemos um trato. Se eu achasse a casa que queria, ela veria a situação do imóvel, se os documentos estavam certinhos, se eu podia comprar sem medo. Negociaria com o dono e ganharia a comissão.

Para um lugar que se propunha ser "livre", até que tínhamos bastantes regras no Sítio. Plantávamos quase tudo que comíamos. Comer animais estava proibido. Qualquer carne era chamada de "cadáver", e comer "cadáveres" acumulava carma negativo. E junto com feijão azuki e abóbora guisada, o que mais se consumia por ali eram cogumelos e LSD.

Passei muitos dias passeando de carro e anotando os telefones das plaquinhas de "vende-se".

As crianças do Sítio frequentavam o colégio e a mortificação da minha vida era ver a Mãe nas festas, com roupas esquisitas e coloridas, cabeluda, cheirando a suor e maconha. Na esquina da escola eu comprava um proibidíssimo picolé de groselha que eu chupava até extrair todo o suco e deixar só gelo no palito.

Visitei algumas casas bem boas, outras nem tanto, e nenhuma era o que eu queria.

Uma vez, uma colega de classe fez sua festinha de aniversário na escola e, ao ser informada, por mim mesma, de que eu tinha comido coxinha e croquete, a Mãe invadiu a escola feito a fúria divina, informando à diretora que não ia permitir que a filha fosse "envenenada". Engraçado notar que eu passei a vida toda me dando esse tipo de rasteira. É só eu começar a me divertir um pouco que logo dou um jeito de me sabotar e acabar com a farra.

Depois de vários dias pesquisando, caí num bairro novo, cara de loteamento recente, perto de uma longa avenida chamada Anchieta. Casas enormes de veraneio, casas menores que podem ou não ser de turistas, e casas pequenas, com quintais grandes, cachorros sem raça, crianças andando de bicicleta - coisas típicas de quem realmente mora no lugar.

As crianças nasciam com regularidade no Sítio, e eu já tinha idade suficiente para saber como burlar a vigilância e assistir aos nascimentos. Eu era fascinada por eles. Adorava a excitação que antecedia cada parto, os mantras, os incensos, as caminhadas que a futura mãe fazia amparada pelas outras mulheres, os gritos, a expulsão do bebê, o sangue, o sangue. Perdi a conta dos partos a que assisti encolhida atrás de uma cortina. Agora, essa aventura toda me parece ser uma irresponsabilidade brutal, temerária e anti-higiênica, mas, por incrível que pareça, só tivemos uma mãe morta em todo aquele tempo, e nunca perdemos um bebê sequer.

Perguntei o nome da rua a um menino de skate na mão. - Rua H-8. Loteamento novo mesmo, as ruas nem haviam sido batizadas. Mais alguns metros pra frente, as casas vão rareando, muitos terrenos, muitos matos. Rua de terra. É assim até hoje. E então, eu a vi.

Os brinquedos e as brincadeiras das crianças, enquanto morávamos no Sítio, eram assuntos graves, seriíssimos, discutidos com solenidade nas reuniões gerais.

Eu sentia a euforia dos malucos em pensar que podia viver ali na praia.

Nós não tínhamos televisão ou rádio, os jornais vnham de São Roque com dias e dias de atraso.

Respiração curta, mãos suando, Dona Alma prestes a mudar tudo, acreditando piamente que uma casa nova seria a solução. Dona Alma e seus eternos recomeços. Dona Alma em busca da treta perdida.

De vez em quando uma de minhas avós nos buscava para "passar o final de semana na civilização". Acho que comia uns dez bifes em dois dias, e eu nem gostava tanto assim de carne.

Por trás da placa vermelha de "vende-se", um portão feito de madeira. Por trás doportão, depois de um quintalão, ela. Branca, térrea, cheia de janelas. Com alpendre. Porta da entrada de ferro e vidro. Sem cara de nada, só de casa.

Mas quando voltávamos para o sítio e eu via nossa casinha amarela, a horta, as outras crianças brincando, eu ficava feliz em voltar. Não queria ficar, mas ficava.

Desci do carro, respirei fundo. Tentei o portão, mas estava trancado. Quando me virei para voltar pro carro, tinha um velhinho a dois palmos do meu nariz. - Boa tarde. Disse que se chamava Lurdiano, que morava a uns 200 metros dali, ouviu o carro, viu que tinha parado, veio ver se era comprador. Disse também que era amigo do falecido dono e se ofereceu para me mostrar a "propriedade".

E de noite eu chorava na cama, de ódio, de ódio. Ser criança é ser absolutamente impotente diante da vida e eu odiava essa sensação.

Seu Lurdiano ainda chama minha casa de "propriedade", como se estivéssemos no campo inglês."

Fal Azevedo (Minúsculos Assassinatos e Alguns Copos de Leite)
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Saudades do Drops


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O bizarro mundo de Iza - Parte 1

Letra por letra (?)
Dormi pouco essa noite. Pulei da cama no usual ridiculamente cedo com a disposição de uma leoa e fui pra academia. Lá fiz o treino dobrado e aumentei a carga de todos os aparelhos, mesmo sem ser o dia. Juro que me cansei pouco. Não sei como. Dizem que o amor (por alguém, por dinheiro, por poder, whatever) é o que move o mundo e concordo. Mas é bem verdade que a raiva, quando sentida direitinho, também traz uma pá felpuda de energia. Pois sim.
A noite de ontem trouxe uma série de sentidos que foram virando outros gradativamente: choque, desapontamento, tristeza e a raiva, ela, que me acompanhou manhã afora e agora virou outra coisa pra qual eu não sei dar nome. Isso tudo por que ouvi um algo inesperado e estranho. Um algo deslocado do vivido e do sentido. E é interessante que de tão aparentemente descabido ele se fez fronteiriço. Ele encontrou lugar naquela linha tênue que separa o bizarro do hilário. E eu, ora em espanto, ora em riso, e sem saber como me sinto em relação a isso, não posso fazer nada além de brincar de soletrar o incompreensível. I êne cê ême pê érre é é êne ésse i vê éle. Incompreensível. Ponto.
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Pandeiro
D, P, U, D, P, U
D, P, U, P, D, P, U, P, D, P, U....
nele, na mesa e no caderno casaco  =)
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