quarta-feira, 30 de novembro de 2011

"Vai um queijinho aí, moça?"
Tarde de terça e cá estou com meus pezinhos na areia e de frente para esse mar sem fim de verde único. Lindo. Não me canso de repetir: lindo. Também não me canso de pensar naquele poema de Fernando Pessoa que diz que a vida parece uma mas é sempre duas: a pensada e a de fato vivida (ou algo parecido). Penso nisso porque  esse viagem tem sido duas. Uma vivida, com horas que passam e praia e sol e vento e situações das que deixam um clima estranho no ar. E outra silenciosa, que observa, quieta, atenta, e guarda para si o valor (mesmo que bobo) dos pequenos acontecimentos. Tem sido assim. Bem, um alguém me disse que nesse tempo aqui eu encontraria a clareza que procuro, a clareza dos olhos para o todo do mundo, e ele estava certo. A clareza me vem a todo instante. A dor e a alegria me solapam por que elas chegam sem pele, sem casca. Claras. Vou recebendo recados de desconhecidos e não perco a oportunidade de recebê-los. Reflito sobre eles e depois os coleciono aqui nesse caderno. Um por um. Vou recebendo o apoio e o afeto do meu amor, que está longe (mas perto, ai, tão perto), e valorizo cada palavra como tesouro precioso que é. Valorizo. E não compartilho nada porque de nada valeria. São coisas que só tem esse sentido para quem as vive. O que posso dizer é que, pelo bom ou pelo estranho, tudo me remete ao amor amplo, ao amor humano. Sua importância, seus limites, seus melindres. E espero não deixar que o tempo e os reveses da vida me façam esquecer dessa clareza que agora mora aqui. Respiro clareza. E escrevo livre, sem me preocupar em fazer sentido.
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Rádio Plutão
cantarola entre beijos.
e ama. ai, como ama.

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terça-feira, 29 de novembro de 2011

Presente
Coquine é uma pipoca chuvisqueira que habita terras estrangeiras. E ela é um ser tão querido que não se contenta em enviar presentes doces (um caderno lindo e um marcador de livros que é uma pequena obra de arte). Ela vai além. Ela vai a um museu na França e vê na tela pintada as palavras escritas por mim em um dos minicontos sobre a falta. E me manda um postal da obra com o miniconto e recado carinhoso no verso. Chorei de alegria boa, me sentindo abraçada lá de longe. =).
Obrigada, querida. Amei ponto.

le repos, arte de jean-françois colson
 
Um susto. E ela levava a mão na barriga. Também o fazia quando ria leve, quando sentia medo e quando alguém trazia notícias boas. Levava a mão na barriga para passar pelo degrauzinho do box na hora do banho. Também enquanto lia, tranquila, entregue ao embalo sonoro da rede. Quase nem notava que também acordava com a mão assim. Sentia a mais dura das faltas, aquela ciente da perda mas ainda inteira imersa na presença vazia. "Todo dia é aquele domingo.", dizia. Ela carregava a falta no corpo. E a protegia. Com a mão.
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segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Hã Biloute?
¨¨ manhã nublada, fresquinha e gostosa na amada brasólis.
¨¨ tataaaa, a sábia, pontuou bem que a gente deveria sempre ter uma semana extra de férias, assim, pra descansar das férias. eu digo amém ponto.
¨¨ maceió é uma cidade dona de um mar sensacional: verde, morninho, com ondas calmas que te chamam em um dengoso "ai, vem". e eu fui. todas as vezes. =). dona também de gente madrugueira que me fez sentir menos et nesse mundo. eu saía para correr às 5 e 30 da matina e dava de cara com o calçadão lotado de gente que já tava ali há muito mais tempo que eu. bonito de se ver!
¨¨ se descansei? si, pero no mucho. se a viagem foi leve? hum, no mucho. mas curti meus momentos, a saudade, o contato com a natureza, o que teve de bom e o que aprendi com o que teve de ruim. não reclamo. acho bonita essa imprevisibilidade que conduz a vida, mesmo quando ela traz surpresas ruins. tudo tem propósito e não sou eu que vou ficar de mimimi. mas acho que aprendi. ufa. =)
¨¨ não sei se vocês sabem, mas sou internacionalmente conhecida por errar o sexo dos bebês que habitam barrigas de pessoas queridas. nêgo pergunta minha opinião pra já contar com o contrário certeiro. nesses 35 anos acertei, pasmem, uma única vez: quando veio a fernanda, filha dos adorados dudu e maria paula (oi mp!! saudades sempre, viu? =)) e só. mas lalous está aí, gerando com carinho mais um sobrinho para a tia di aqui, e algo me diz que vou contrariar as expectativas e acertar em cheio. vai ser menina ponto. nina, lindo nome provável, vai ser recebida com alegria sem fim por todos nós! =)
¨¨ e é isso. uma semana aconchegante e leve a todos. tava com saudades. =). beijosmil!
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Sem medida
Cheguei de viagem mas ainda não cheguei em casa. Dona Elzinha querida
perambula pelas Minas Gerais e eu cumpro feliz a incumbência de cuidar
da casa e da Margot cachorromaisfofodoplaneta. E ontem à noite eu
guardava a louça quando me peguei com os olhos fixados no copo medidor
azul que descansava ali no armário da cozinha. Óleo, água, açúcar,
etc, com marcações precisas de suas quantidades. Bonito isso. Queria
ter um copo desses, mas feito para outras coisas não tão facilmente
mensuráveis.
Tento seguir meu caminho guiada pela máxima "só faça com os outros o
que você gostaria que fizessem com você" e boto fé que o mundo seria
menos cão (pois é cão simsim) se essa reflexão fosse imprescindível.
Por que ninguém é bobo. Sei que todos somos confusos, vivemos trocando
os pés pelas mãos, mas nosso discernimento funciona muito bem obrigada
quando se trata do nosso próprio umbigo. E trazer para a nossa pele os
efeitos do que fazemos com os outros clareia a compreensão e a decisão
entre o "certo" e o "errado" naquele momento. Não estou aqui no
intuito de pagar de perfeitinha... muito longe disso. Também faço
merda ponto, mas sei que faço menos desde que incorporei o trem.
Beleza, minha questão é a seguinte: em que ponto esse modus operandi
deixa de ser salutar? em que medida essa compreensão ampla vira uma
forma de passividade?
Pergunto porque acredito que essa filosofia de "se colocar no lugar do
outro" vicia.  E, estando constantemente transposto, você entende demais o
outro nas suas limitações. Parece bonito, mas não é.
Nêgo te falta com o respeito? Te trata com descaso? Te causa
sofrimento com ações várias? Está tudo bem, já que você sabe que
aquilo é uma limitação do outro. Putz, foi phoda... mas você entende
que o outro agiu assim por que é egoísta ou altruísta, fala demais ou
tem dificuldade em se expressar, está passando por um momento difícil
(e quem não está?) ou acabou de sair dele ou nunca encarou o difícil,
é muito poliana ou é pessimista ao extremo, e por aí vai. Você sabe
que todos nós temos nossas limitações, você inclusive, e deve
entender, conversar numa boa e perdoar tudo com o coração cheio de
amor, né?
É?
O problema é que essas atitudes ditas "louváveis" acabam fazendo com
que os outros acreditem que podem fazer o que for, pois você sempre
vai entender e vai ficar tudo bem. Você é "sensacional", "invejável",
"de boa", "está acima de picuinhas". Você aguenta tudo.
É?
Me parece que compreender demais te deixa conivente, passivo. A
intenção é excelente, sem dúvida. Mas a falta de limite acaba se
tornando terreno fértil para que os outros deitem e rolem diante da
sua permissividade. Então, alguém please me diga: qual é o limite? Em
que momento a gente deve jogar a compreensão no chão e gritar na cara?
Quando?

Provavelmente antes de agora.
E de agora em diante.
Sem mimimi.
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segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Férias!!!
I'm in heaven dancing cheek to cheek ponto.
Diz pra eles, ella e louis! =)

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quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Arrastão
Não é por nada assim muito grave não, é por que cansa. Você olha pela janela e lá está o mundo todo cansado. Por trás das caras aquelas mesmas diárias - talvez com cor, talvez com nada - o desbotado escondido arregala os olhos e te laça sem fita. O som dos sapatos parece de solado mas é do chacoalhar dos ossos enterrados nas paredes, como já sabia o Gabriel Garcia Márquez. Todos nós ali, digerindo em silêncio necessário, fazendo o possível e ignorando com graça o que ainda não é de digestão. Todos nós ali, quase guerreiros um pouco sempre quase vencidos. Nada grave. Vive-se bem assim. Mas há dias em que, sabe-se lá como, você vê, ouve e sente o cansaço guardado até de quem só passa. Você é rede grande enchendo de peixe em peixe. Você é braço esticado que abraça maisquear. E você se cansa. Também. Só que mais.
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terça-feira, 8 de novembro de 2011

Hã biloute?

fotoca que copiei e não anotei a fonte. sorry. =(

¨¨  Dia frio, chuvoso e gostoso.
¨¨  O fim de semana foi de uma maciez laranjada. Excelente companhias, colo a quem precisava de colo, singela arrumação na minha bagunça quarteira, saudadinha festiva, morgação, rede, corrida no eixão repleta de "bom dias"e leveza, leveza, leveza
¨¨ Iza Cosenza está em um relacionamento sério com "modern family". Viciada ponto. Tudo culpa da Cecília. E isso não é uma reclamação. Meu estoque infinito de risos bobos agradece! =)
¨¨  "Sim, é como a flor/ de água e ar, luz e calor/ o amor precisa para viver/ de emoção e alegria/ e tem que regar todo dia." Sim, eu sou antiga, eu sei. =)
¨¨ Se você quiser passar um dia todo observando as mais variadas reações humanas faça o seguinte: corte na nuca o cabelo que estava no meio das costas and enjoy the show. "uaus", espantos, elogios tímidos, invejas do dito "ato corajoso" (coragem de que? é só cabelo, minha gente!), sorrisos abertos, cafunés de minuto de gente que nunca te encostou na vida e por aí vai. Mas o meu preferido foi o "misericórdia!" que uma senhora do trabalho gritou lá do final do corredor. Ela disse que era um pecado cortar assim um cabelo daqueles e que se eu fosse filha dela ela não permitiria. rs! Eu? Tô leve e feliz da vida com os meus quasecachos curtinhos. =)
¨¨ Falzuquitcha me cita lá no drops e eu fico toda boba... AMO essa mulher. Loucamente. Ponto.
¨¨ O amor dele me traz uma alegria azul. Que dá vontade de ficar na pontinha dos dedos e espreguiçar em sorriso, bem devagarzinho. Esse tipo de alegria.
¨¨ O pior não é tocar "you give love a bad name" do Bon jovi na meio da aula de spinning. O pior é eu descobrir que sei cantar a dita quase toda de cor e cantar achando bom. I give music a bad name. Shame on me.
¨¨ Esqueci de contar que (finalmente, já era hora) descobri meu talento nato. E não tem nada a ver com palavras ou tintas ou atos impensados (como eu imaginava). Queridos, venho aqui dizer que eu nasci pra compor funks! Os "versos" brotam na minha mente de maneira ridícula de tão natural. É lindo! Chega de investir em textins e desenhos de bichos... o meu rio de dinheiro virá do funk ponto. E só não posto aqui minha primeira composição por que ela é deveras pornográfica e mimha mãe lindinha lê o blog de quando em vez. (oi mãe! =))
¨¨  Não entendo como uma revista é capaz de cometer a insanidade de colocar a Sandy entre as 20 mais sexys do ano. Não entendo. E não entendo como alguém como eu perde tempo lendo a tal lista e AINDA questiona o trem.... aff! Francamente.
¨¨ E acho que é isso. Beijos a todos!
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Palavra Roubada 1
Da felicidade simples
"Acabei de assistir Somewhere de Sofia Coppola, o primeiro presente de 2011. Eu não entendo muito de cinema, mas não resisti e escrevi umas linhas sobre esse filme bonito.
Somewhere é um filme sobre coisas simples. É também um filme sem lição. A ausência de sentido na vida de um astro hollywoodiano, seus excessos esvaziados de prazer, são tão clichês quanto nossos dias tediosos. Mas não porque o filme tem um viés realista ou de identificação, e sim pela sua capacidade de narrar uma história singular fazendo com que prestemos atenção no seu modo. Trata-se, portanto, de falar sobre como viver junto, como se estabelece uma relação que, embora seja com a própria filha, não é natural, nem óbvia, é sempre construída. Sofia Coppola fala sobre como fazer, e não sobre o que fazer mantendo a normalidade dos acontecimentos sem nenhuma ruptura brusca para que se repense a vida, o comportamento, os hábitos, etc. Por isso, é um filme sem lição.
É o cotidiano trazido à superfície imagética tão visível quanto invisível aos nossos olhos. Tão recheado de acontecimentos e possibilidades que sequer percebemos ou aproveitamos. As decisões tomadas, os compromissos cumpridos tudo segue cotidianamente dentro de uma vida normal sem muitas explicações (como as sensacionais mensagens do celular). Mas há a experiência e o sentido construído sempre depois dela. A diferença é que em Somewhere, a excepcionalidade dos acontecimentos, porta aberta para a felicidade, não é catártica; ela surge quando se torna possível ver uma parte do mundo embaixo d'água. É uma mudança de perspectiva. E assim é nosso cotidiano: incrivelmente tedioso e potencialmente mágico. (grifo meu.!.) O mágico, no caso de Somewhere, é que Coppola consegue inserir na superficialidade e aparente automatismo do dia-a-dia uma felicidade simples, que está sempre ali, à espreita: somewhere, sometime."
Flávia Cera (daqui ó)
diquinha boa da lutianita. obrigada, meu bem!  =)
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Palavra Roubada 2
Soma
"Coma! Teu soma precisa
do aroma do leite
a ferver no metal
fundido, busca o ferro
da carne prensada,
resfriada e envolta
em trigo e mais laticínios:
é cálcio também,
por que não?

É osso com osso numa boa,
em químicarmonia em meio
a tendões, tensões
junto ao tortuoso solo;
é rolo em cima de rolo
que só c'um bom bife
acebolado com dois olhos
[em cima] p'ra enxergar
a solução.

Pelo sim, pelo não
e o talvez, mais uma
vez alimento-me muito mais
de teus afagos, temperos
d'alma; pura energia vital;
primordial fator de saciedade
mental - elo entre o já dito
e psique - como num sopro
de paz, de forma plena, me satisfaz.

Que todo exagero seja beijo,
que toda gula seja desejo,
que atenuo em tua carne - tênua
linha entre o pueril e a febril
face da volúpia - macia como tudo
que aconchega; quente, como todo
verdadeiro ninho, todo berço
de carinho, todo lar de verdade:
sem culpa, sem dúvida, sem senão."
Felipe Sanches ( do excelente poesia de padaria)
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Rádio Plutão
na linha "entregando a idade" meets "as porcarias que a gente curte em segredo".
dá nisso. =)
 
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sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Flor e marimbondo

arte de duy huynh

Lá estava ela: os mesmos olhos e colar com pingente de flor. Ainda usava maria chiquinhas e cuspia marimbondos quando a vida pedia. E como passava os dias lendo o que ninguém lê, sua mente tempestiva - abarrotada de sentidos - às vezes não a deixava dormir. Ela trocava a cabeça pelos pés, cobria os olhos com cheiros, abraçava o elefante de pelúcia, virava água corrente de rio e nada. Permanecia acordada. Até que descobriu uma forma de aproveitar melhor aquele tempo inquieto. Nas noites de nãosono ela vestia uma capa florida que a fazia invisível aos olhos noturnos. E, invisível, ela invadia casas à procura de barulhos que pertubavam os preocupados, tristes e de sono leve. Vasculhava os cômodos e os arredores e fazia o silêncio do descanso imperar. Calava corujas, cessava o ronronar das geladeiras, fechava pingos de torneiras, segurava ponteiros de relógios e parava o bater das janelas com suas mãos pequeninas. E depois de limpar toda a perturbação do ar, se aproximava do já dormindo e deixava cair sobre ele palavras de nino. Caía inteira, perdia ela seu próprio corpo em quasecanto sussurrado para afastar os pensamentos ruins, os desagrados, as dores de alma que teimavam em sacudir o sono de quem estava ali. Depois da tarefa cumprida, leve também do seu pesar, voltava pra casa em passos mudos e deitava na cama tendo na capa o aconchego do melhor cobertor. E dormia. Só então dormia.
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quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Palavra Roubada


Por uma vida mais Anti-heróica
"Não tomo jeito. Não amadureço. Não deixo de perder, nunca.
Deixar de me orgulhar é minha maior vocação.
Sinceridade degenerativa. É comigo mesmo.
Mas sou um bom moço. Desde que não me peçam nada.
Não que eu faça por mau gosto. Mas é que eu faço sempre errado.
Não por maldade. Talvez eu tenha Asperger. Ou seja um baita de um fresco.
Mas às vezes eu faço certinho, e até se orgulham de mim.
Expectativas, não as crie! Elas podem se virar contra você.
Cante uma música, duas, três… até ficar sem voz. Os fantasmas devem sumir. Ou cantar contigo.
Na hora do cansaço, procure um amigo, mas um “daqueles”.
Se não achar um amigo, encha um copo.
Se não achar um copo, arranje um travesseiro bem fofo e o aperte, desesperadamente.
Leia um gibi, bata uma punheta, coma uma caixa de doces. Procure briga na rua.
Olhe para a lua, para as estrelas, peça para que os OVNIS venham.
Grite: VAI TOMAR NO CU o mais alto que puder.
Daí você vê que o planeta Terra é o que tem pra hoje, e volta pra lá.
Daí você compra um relógio e uma agenda.
Daí você amarra os cadarços e abre a porta da garagem.
Daí você coça a cabeça e lembra o quão grande é o mundo.
E o tanto de coisas que ainda dá pra você tentar fazer antes de desistir.
E se não der certo? Foda-se. Foda-se mesmo.
Se for pra se agarrar num clichê, que seja o ‘ligue o foda-se e seja feliz”.
Não recomendo cautela, calma, serenidade nem nada. Recomendo que faça.
Se errar, foda-se. Se acertar, foda-se. Não tem jeito.
Por mais que fique rico, famoso, saudável e cheio e de seguidores no meu blog,
o fato mais cruel e inescapável é o de que eu vou morrer sozinho.
E você também.
Portanto, vivamos mais juntos, mesmo que errando pra caralho.
Não quero ser cobrado pela perfeição que querem me dar.
Quero ser sentido, abraçado e compartilhado. (grifo meu. !)
Se não gosta, não entende ou apenas julga, é mais fácil que apenas ignore.
Não sou um bom moço, mas não sou um vilão sanguinário.
Apenas assumir os pecados pra tentar pagar as indulgências para que
o dia-a-dia, lazarento por nascença, seja menos penoso."
André Oliveira (o link do blog dele tá ali ao lado)
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Por que amo a Fal
na rua, dando sequência... =)

"Senhora Helena
 Antes de tudo, vou pedir desculpas pela demora em respondê-la. Não peço desculpas de nada nem a ninguém, nem dou explicações sobre o que quer que seja a quem quer que seja. Não percebo porque alguém haveria de se interessar e já não disponho mais de pudores que me provoquem a necessidade de me desculpar por algo que tenha feito, dito, pensado ou desejado.
Há pessoas que pensam, provavelmente, que sou amargo. Que sou estranho. Que sou arrogante. As pessoas pensam o que querem, senhora Helena. Não me importo com elas. Sinceramente, não faço a mínima sobre o que passa na cabeça de qualquer pessoa desse mundo. Todos pensam muito sobre tudo, o que significa que não pensam nada sobre nada. A única pessoa a quem eu daria explicações, pediria desculpas ou coisa que o valha seria Beatriz. Mas me senti aqui tocado pela sua carta, veja só, a segunda que recebo da senhora em tão pouco tempo. Há anos não recebia nada, como já disse, e pela segunda vez recebi seu envelope verde, o que provocou em mim uma reação bastante curiosa. E é a essa reação que se deve minha demora em respondê-la.
Ao receber seu envelope verde, senhora Helena, não senti medo. Não, desta vez não senti nenhum medo. Ao contrário, senti uma enorme vontade de cantar. A senhora canta, senhora Helena? Eu não canto. Nunca cantei. Sou incapaz de emitir um arrulho sequer, ou mesmo um som gutural, ou mesmo de movimentar os lábios para qualquer lado com a pretensão de que deles saia uma melodia. Uma vez minha mãe fez uma competição em casa, senhora Helena. Éramos cinco irmãos, eu o mais velho, depois duas meninas, depois outros dois meninos. A competição consistia em cada um cantar a melodia que mais lhe agradasse e, pelo voto direto de todos, o que melhor desempenhasse a função de rouxinol-mirim ganharia um mês de sorvetes e uma semana sem fazer as lições de casa, que seriam realizadas por minha mãe. Evidente que meu pai não imaginava nada disso. Na minha vez de cantar, senhora Helena, emudeci. Minha boca ficou presa na forma de um “o”, e era impossível movimentá-la. Passei três dias assim, senhora Helena. Uma paralisia, que gerou muitas visitas médicas, cerca de quatrocentas injeções de um líquido amarelo em minhas nádegas e o pânico eterno de cantar. Esse pânico ainda se tornou maior e se transformou em vergonha já que meus irmãos, depois do fatídico, para mim, concurso caseiro, formaram um grupo vocal, agraciado em Viena como a maior revelação da música erudita na Europa. Desde então, não canto.
Sua carta, então, me deu vontade cantar. Sentei na escada do meu edifício, senhora Helena, respirei fundo e sem me dar conta do que fazia, me senti Charles Aznavour e cantei Que C´est Triste Venise. Cantei, senhora Helena! E os vizinhos abriram as portas, e mesmo assim eu não me sentia intimidado, e todos olhavam admirados, não sei se por alguma eventual qualidade musical ou pelo estranho fato de alguém como eu, segurando um envelope verde, cantar Que C´est Triste Venise, no hall, sentado na escada. Ao fim, senhora Helena, todos me aplaudiam. Me aplaudiam, com fervor. E ouvi alguém gritar “bravo”, e alguém me jogou flores do último andar. Eu era Aznavour, senhora Helena. Eu cantei. E foi a sua carta que me fez cantar. Mas fiquei sem entender porque Que C´est triste Venise. Nunca fui a Veneza. Mas subi, senhora Helena, em meio aos abraços efusivos dos vizinhos, e li a sua carta, e agradeço por querer me ajudar a encontrar Beatriz. Não creio, às vezes, que isso seja possível. Reencontrar Beatriz. Mas decidi algo. Vou a Veneza, senhora Helena.
Há anos não saio deste cubículo em que vivo, nem desta cidade. Vou tomar um trem, porque não tenho pressa, as pessoas sempre têm muita pressa e eu não tenho nenhuma. Não acredito em viagens de avião. Toda viagem tem de ser por terra, para que se perceba o deslocamento do tempo. Enfim, vou sair daqui e vou a Veneza. Talvez consiga entender porque surgiu em mim essa canção que fala de Veneza e de amor e de desamor.
Se me permitir, enviarei nova carta, contando algo. Não sei se lhe incomodarei.
Ia falando tanto de mim que quase me esqueço de algo que realmente me causou surpresa, talvez até estranhamento. Senhora Helena, eu lhe afirmo que nunca, jamais, enviei uma carta sequer em envelope cor de vinho. Não sou afeito a esses caprichos, senhora Helena. Meus envelopes, digo novamente, são como eu: sem cor. São sempre brancos. Completamente brancos. Não creio que seja daltônica. Mas nunca utilizei envelopes cor de vinho. Não compreendo. Não compreendo.
Outra coisa: me surpreende também a qualidade de sua escrita em francês. Pude deduzir que é brasileira, mas que lindo o seu modo de escrever em francês. Nem Blanchot o faria tão bem. Já viveu em França?
 Um abraço,
 H."
Fal Azevedo
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