domingo, 31 de agosto de 2025

" eu abro meu Neruda e apago o sol..." 

Os tão tocados e tão tão movidos pelas palavras. Nós. 
A ridiculamente desafiadora tarefa de educar filhotes. Você não sabe a hora que vai precisar ensinar o que nem sabia que precisaria ensinar. A situação simplesmente se dá e pronto, vire-se. E você se vê ali, tentando dizer com algum sentido algo que não sabe se sabe dizer e nem sabe se os filhos vão saber entender. É não saber atrás de não saber. Às vezes me sinto em mar revolto, tendo que segurar o barco na força do braço e ao mesmo tempo dar orientações a pequenos tripulantes que mal sabem a diferença entre terra e água. É desesperador. Mas sinto que quando falo pra eles desta minha teia de não saberes, me abro, me vulnerabilizo, eles se esforçam mais pra me ouvir, me entender. É um cadinho menos pior e mais produtivo mas, putz, só alivia um pouco a sensação de que fui erroneamente escalada para um papel que tenho zero expertise pra interpretar. E quem tem? 
Acho sotaque um lance muito interessante. É um jeito de cantar a fala. E se o de Minas, que me é tão familiar, segue arrastando palavras diminuídas e diminutivas, o do Rio Grande do Sul se apresenta aos meus ouvidos quase como outra língua. É todo um vocabulário diferente e todo um jeito de colocar ênfase no final de certas palavras ou no final de todas elas. Acho graça. Por vezes me perco tanto observando essa cadência que não presto atenção no que ele diz. Aí rio em "eita viajei o que que cê disse" ou simplesmente disfarço. rs 
Amo o gramadão dos cachorros por um leque de motivos: o espaço aberto, a grama, a luz da tarde, as crias soltas se soltando com os bichos - envolvendo tropeços, quedas e arranhões-, a prosa boa com os humanos dali, o sol que vai sumindo aos poucos até que sua ausência completa nos diz que é hora de ir embora. Isso tudo é lindo. Mas confesso que o que mais me apetece é EU estar em meio a, sei lá, 15 cachorros. E aprender os nomes e fazer carinho e correr junto e ser quase atropelada e sentir falta dos que faltam e jogar bolinha e aprender o jeitinho de cada um e ter meus preferidos. Me sinto a Iza criança no quintal da casa da Vó Elza com a nova ninhada de Mila e Galbak. Me sinto a Iza criança sendo a Iza criança. 
Tanto a dizer sobre "Um romance russo" e sobre o impacto de "A rosa mais vermelha desabrocha" e sobre a prosa poética quente e de ar parado de "A cabeça do santo", mas sou mãe cansadita e repito hoje não, hoje não, hoje não.
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Rádio Plutão 




domingo, 24 de agosto de 2025

"Caminar descalzo, caminar despierto"

Bastante tempo sem escrever. Quase duas semanas escrevendo na cabeça sem parar para colocar um a no papel. Dias e dias seguidos de mais dias com energia quase nula para o virtual e mantendo, na medida do possível, olhos e mãos longe da tela do celular. Sinto que, cada vez mais, quero cada vez menos dessa órbita e que de tempos em tempos preciso me afastar pra conseguir dosar, achar o tanto muito ou tanto pouco que faz sentido pro agora em questão. E a verdade é que não tem sido algo que demanda esforços, disciplina. É como se fosse um movimento necessário e natural. Como se uma clareza observativa se abrisse em mim, mostrando para onde minha energia quer ir, e meu corpo e mente a seguissem sem resistência. Aí que andei imersa, solta em outros ares. Deliciosamente solta. Com tempo até quando sem tempo. Imersa em mais silêncio, em leituras, em saudade leve e gostosa, em contemplações quase meditativas, em estar presente com outros nos mais diversos lugares, de gramados a bares. Imersa, presente, solta. De mim e em mim.

terça-feira, 5 de agosto de 2025

Retórica 
E se a mola da gana de fato morar fora do linear? No que escapa do roteiro, no que desvia, no descontínuo?
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Rádio Plutão 



sábado, 2 de agosto de 2025

Bonito isso

com Milly Lacombe, que é belíssima 

Perai que vou buscar meus óculos. Pronto. Bem melhor. E é por aí.  Quando criança tinha esse sonho de usar óculos por que achava (e ainda acho) absurdamente marcante e charmoso, mas eu tinha olhos de águia, visão perfeita. Aí que aos 44 fui renovar minha CNH e descobri que não conseguia mais ler bem de perto. Hoje, aos 49, a vida de perto é só borrões se sem óculos. Rolou um tempo de adaptação, mas confesso que adoro meus óculos e, de verdade, adoro precisar deles. Não tenho síndrome de Peter Pan, eu acho. Fico bem feliz que não morri (pra morte, por que em vida já dei umas morridinhas) e vou juntando em mim minha bagagem. Me orgulho dela com o seu pior e o seu melhor. Entro em uma ou outra crise de quando em vez, pois estou inserida nesta cultura etarista e misógina e machista do cacete, mas me sacudo e saio delas em 3, 2, 1. 

Bom, introdução à parte, o ponto é meio que esse e meio que outro. Queria falar sobre as rugas. Estou assistindo ao seriado The Pitt e putz, o Noah Wyle. Lembro dele dos tempos idos de E.R. e que bonito é vê-lo com seus 54 anos e suas rugas. E veja bem que eu não estou me posicionando politicamente (apesar de estar). Eu acho realmente bonito Noah e suas rugas. Bonito. Atraente. Verdadeiramente bonito. Minha pergunta é: quem inventou que envelhecer é feio e deve ser evitado esteticamente a todo custo? Quem? Que loucura é essa? É genuinamente bonito, na boa. E talvez W. tenha chegado em minha vida também pra reforçar este olhar. Ele é 11 anos mais velho que eu, e eu o acho bonito, repetindo, genuinamente bonito. Quem decidiu em caráter coletivo que o tempo vivido imprimido na pele é feio e deve ser negado? Sou a única mulher de 49 anos que conheço que nunca fez nada de harmonização facial e nunca me senti tão bem. Sei que posso mudar de ideia (não linear e contraditória, lembra?) mas confesso que tenho hoje em mim uma autoestima quase delirante. Gosto de quem me tornei, do que penso e emano, da minha aparência, do meu estar de agora. Não tenho mais rosto de menina e por que teria se não mais sou? Tenho meu rosto de mulher. E acho realmente belo Noahs e Ws e Eus exibindo suas trajetórias no rosto. Como isto não pode ser belo? É! Pra mim é.