quinta-feira, 25 de setembro de 2025

Sutis

Passo roupa ou paro para escrever? Um exemplo dos nada glamourosos dilemas cotidianos. E veja bem que não parar para escrever não significa necessariamente ter parado de escrever. Minha mente segue escrevendo. De perguntas retóricas a textos inteiros que vou tecendo ao longo dos dias. Num passado um tanto já distante, eu usava o que tivesse à mão na hora que fosse por receio de perder os meus rotineiros lampejos palavreiros, pois sabia bem da força presente do esquecimento em mim. Achava uma boa alma que me emprestasse uma caneta e lá se iam guardanapos, versos de recibos, braço esquerdo. Certa vez, no falecido e saudoso Schlob, me fechei no banheiro e escrevi um "trecho esparso sobre o amor" que saiu pronto e definitivo na parte alta das coxas. Mas não funciona mais assim. E nem é porque o celular cumpre essa função de cobrir as urgências da escrita. Hoje, não me importa tanto deixar ir. Deixo ir o que for de ir. Outras coisas serão escritas ali na esquina. Ou não. O tempo vivido vai ensinando a gente a perder, a entender que as coisas seguem em movimento. "Viver é perder", bem disse Milly Lacombe. Mas veja bem que aprender a perder não significa necessariamente ter parado de sentir as perdas. Sinto. Só acho (ou quero crer) que hoje sei descascar com algum sucesso os medos que criava em volta delas, das perdas. Acho (ou quero crer) que sei perder melhor. Aí sobra energia e olhar para perceber outros medos mais sutis, antes desconhecidos, mas não menos importantes. Medinhos escondidos nas beiradas, no fundo das gavetas, dentro de páginas marcadas de livros. Mergulho neles. Nos sutis.

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Retórica

E se te confunde o amor "com todo o seu tenebroso esplendor"?


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