quarta-feira, 6 de julho de 2011

Eu não resisto
malvadezas! bom simsim. =)

Amor no bar
"Foi logo depois que o bar abriu suas portas.
As últimas luzes do dia ainda entravam pela janela de forma teimosa. O barman limpava o balcão preparando-se para receber os primeiros clientes, que costumavam aparecer no início da noite. Muitos ficariam ali até de madrugada, lamentando a vida e procurando um pouco de consolo no fundo dos copos.
Mal havia acabado de limpar o balcão quando ouviu a porta se abrindo. Era um homem de meia idade, com ar cansado. Vestia um terno amassado e carregava uma pasta. Caminhou em direção ao balcão, sentando-se num banco e mal ergueu os olhos quando fez seu pedido.
- Um duplo. E amendoim.
Em silêncio, o barman serviu a bebida e empurrou o pratinho na direção do sujeito, que bebeu metade do copo de um gole só e encheu a boca com os salgadinhos.
- Já deixa mais um duplo engatilhado aí.
Um pequeno alarme disparou no cérebro do barman.
Em seus anos de experiência atrás do balcão engordurado, havia aprendido a prestar atenção nos homens que pediam a segunda bebida antes mesmo de terminar a primeira. Diferente dos demais, que iam ao bar somente por não ter outro lugar para ir, estes homens eram aqueles que bebiam para esquecer.
E os anos atrás do balcão também haviam ensinado ao barman que existem somente dois motivos que fazem com que um homem precise beber para esquecer.
- Mulher ou trabalho?
Sem pressa alguma, o homem terminou de mastigar os amendoins e deu mais um gole antes de responder.
- Trabalho.
- Dia difícil?
- É. Pode-se dizer que sim.
O barman trocou o prato de amendoins sem falar nada. Tarimbado por anos e mais anos de histórias amargas, era quase um especialista no que diz respeito ao fracasso. Já havia enchido o copo de fracassados de todos os tipos, cores, religiões e níveis sociais. E sabia que o melhor a fazer era deixar espaço para o cliente desabafar. Mas como o homem continuou em silêncio, ele entendeu que era sua vez de falar.
- Você trabalha em quê?
- Eu sou o Amor.
Pela primeira vez em anos, o barman se sentiu genuinamente surpreso com a resposta de um cliente. Na verdade, esperava que o homem fosse um advogado de porta de cadeia. Ou talvez um vendedor, daqueles que vão de porta em porta. Mas o Amor?
- Como assim?
- O Amor, sabe? Ah, claro que você sabe. Todo mundo já ouviu falar de mim. Essa música que está tocando.
- Ray Charles.
- Isso. Escuta essa parte.
They say the time
Heals a broken heart
But time has stood still
Since we’ve been apart
- Viu? Está falando de mim.
O barman pegou um copo e serviu-se de uma dose. Automaticamente, encheu novamente o copo do sujeito.
- Eu não sabia que o Amor era uma pessoa.
- Não sou. Mas posso assumir a forma que quiser. Qualquer pessoa, qualquer bicho. Facilita bastante quando tenho que trabalhar fora do escritório.
- Você trabalha muito na rua?
- A maior parte do tempo. Normalmente passo as manhãs no escritório mexendo em relatórios, e depois do almoço vou para as ruas.
- Relatórios? Que tipo de relatórios?
- Ah, o de sempre. Quem se apaixonou por quem, quem pediu quem em casamento, quantos “eu te amo” foram ditos no dia anterior. Aí comparo com as metas do mês e vejo como está meu desempenho. Tem mais amendoim?
- Aqui. Mas todo mundo procura o Amor o tempo inteiro. Seu trabalho não deve ser difícil.
- Isso é o que você pensa. Todo mundo acha que procura o Amor. Mas quando eu apareço, não sabe o que fazer comigo. Tudo por causa das comédias românticas. Serve mais um para mim e para você. Eu pago.
- Comédias românticas?
- Sim, os filmes, você já viu? Dá mais amendoim aí.
O barman encheu a pequena vasilha em silêncio. Nunca havia contado para ninguém que um de seus filmes preferidos era Harry & Sally, e não seria agora que iria escancarar isso para o mundo.
O sujeito do outro lado do balcão continuou.
- Por causa deles todo mundo acha que é fácil, que o Amor sempre vence no final. Então ninguém se esforça mais. As pessoas acham que basta ter duas ou três frases bonitinhas no bolso, uma música boa como tema, e pronto. O homem ou a mulher da sua vida vai aparecer e você vai ser feliz para sempre. E não é assim que funciona.
- Não?
- Claro que não! E a dedicação? E a compreensão? O perdão? O esforço em aceitar o outro como ele é? Fica tudo nas minhas costas! E, quando não dá certo, a culpa é de quem?
- Sua?
- Claro. Quantas pessoas você não ouviu dizendo que “o Amor não presta”? Não é culpa minha se as pessoas acham que a vida é um filme. Olhe, se um dia eu encontrar essa Meg Ryan na rua, eu atropelo. Eu nunca tentei me transformar num carro, mas acho que consigo. Essa mulher que se cuide. Dá mais um aí.
- Mas se você está tão sobrecarregado assim, porque não pede ajuda?
- Ajuda? Deixe eu te explicar uma coisa. Eu trabalho num escritório de cinco metros quadrados, com duas mesas. Eu fico em uma, e meu estagiário na outra. Sim, eu tenho um estagiário. É um cupido irresponsável.
- Como assim?
- Ele mal sabe escrever o próprio nome. Outro dia escreveu Amor com h. H-A-M-O-R. E, quando eu estou fora do escritório, ele sai dando flechadas em todo mundo. Você faz ideia dos problemas que isso me cria? Pessoas que não têm nada a ver uma com as outras se apaixonando e achando que aquilo é Amor. E eu tenho que consertar tudo sozinho.
- Mas porque você não o demite?
- Ele tem as costas quentes. É amigo de um sobrinho de Eros, ou algo assim.
- Você já tentou pedir mais ajuda?
- Mais de uma vez. Cheguei até a fazer uma coletânea com músicas sobre o Amor, para mostrar que eu sou importante para as pessoas. Era uma senhora coletânea, sabe? Serve mais um pra mim. E mais amendoim. Pedi para que o cupido fizesse e indiquei algumas músicas. Frank Sinatra, U2, Eric Clapton. Não deu certo.
- Por quê?
- O cupido achou que seria legal abrir a coletânea com Claudia Leitte. Ele disse que ia causar impacto. Resultado: ninguém nem levou a sério.
- Mas e o U2? O Clapton?
- Nem ouviram. Aliás, foi pior. Pegaram um DVD da Cláudia Leitte emprestado com a Luxúria. Ela tem todos. Agora, ficam assistindo o tempo todo agora, no escritório. O pior é que o cupido nem trabalha mais. Fica o tempo inteiro cantando junto e fazendo coreografias. Mas, por outro lado, eu acho que a coletânea não iria ajudar mesmo.
- Por quê?
- Porque as pessoas ouvem estas músicas, se emocionam, acham que o Amor é lindo, mas não fazem nada a respeito. Não adianta o Eric Clapton gravar Wonderful Tonight e ninguém fazer sua parte. As pessoas precisam entender que não é a música que faz o Amor ser bonito, mas sim o Amor que faz a música ser bonita.
- Bem colocado.
- Falta vontade das pessoas. Aliás, que horas são?
- Quase sete.
- Preciso ir. Tenho que resolver um problema na Coréia ainda hoje. Um cara vai brigar com a esposa, sair de casa e se apaixonar pela irmã da vizinha. Vai se divorciar e casar com ela. Em dois anos, vai se divorciar de novo. Nenhum dos três vai se apaixonar novamente e passarão o resto da vida me xingando. Tenho que impedir isso.
- Como?
- Não faço ideia, vou pensar em algo no caminho. Fecha a minha conta, enquanto eu procuro o endereço na pasta.
- Não. Fica por conta da casa. Esse bar precisa de um pouco de Amor às vezes.
- Obrigado. Não vou me esquecer disso. Sério, e para entender a letra desse cupido? Isso é aqui é um H? Ou um K?
- Acho que é um K. Acho.
- Merda de cupido. Bom, eu me viro quando chegar lá. Boa noite.
Saiu sem olhar para trás. Minutos depois, os clientes regulares começaram a chegar. Em pouco tempo, o bar estava lotado de homens com rostos marcados e olhar cansado. Todos bebiam em silêncio, com o fracasso estampado em seus olhos. Às vezes, maldiziam a vida e os próprios empregos.

E resmungavam algo sobre o Amor e o fato de ele ser um grande filho da puta."

Rob Gordon
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2 comentários:

  1. kkkkkk :) isso é pq ele não viu novela da globo e do sbt ainda... o dia que assistir um pedaçinho só mata a gente tudo... hihihihihi

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  2. rs!
    certeza que o Amor não tem tv em casa, pequi! =)
    esse rob gordon malvadezo é sensacional, nénão?
    beijobeijop'c!

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