Diária, querida, é relevante definir relevância?
Hoje escovei os dentes, veja bem, antes do café preto. E sei que estou compartilhando contigo essa informação (irrelevante?) como um possível subterfúgio para o fato de não ter elaborado minimamente o que pretendo dizer. É para isso que estamos aqui - eu, caneta, caderno e você - certo? Não só para o que foi pensado e repensado e já cai meio que pronto no papel, mas também para o que prescinde da linha lógica que, a princípio, tanto importa para quem escreve. Penso que um certo senso de desimportância chega a ser refrescante e rima com a manhã de domingo. Isso dito, sigamos, do jeito que for.
Decidi fazer de hoje um dia livre. Casa só minha, nada marcado ou esperado, celular na gaveta. Céu aberto em azul sonoramente ornado por passarinhos quase frenéticos lá fora e Margot deitada em seu travesseiro lilás aqui dentro. E a frase que se repete na minha cabeça é "Gosto de viver o que acontece comigo". Foi o que Maggie disse para Alma no excelente "Depois da Caçada" para pontuar o que tanto as difere. "E nada te afeta" veio a seguir. Achei bonita essa clareza. Clareza que levou anos para alcançar a personagem. Antes disso, Maggie venerava sua mentora, queria não apenas ser como ela, mas ser ela. E quantas vezes, diária, somos o outro ao invés de sermos nós mesmos pelas mais variadas razões? Raso pensar que seria só por falta de entendimento próprio ou negação do "eu". Boto fé que há toda uma atração pelo universo vasto do que é diferente, trazendo ares de encantamento. E simsim o diferente é rico, ainda que sirva apenas para explicitar o des-afim e até a repulsa, percepções importantes que nem serão sentidas se evitarmos a todo custo o que não se aproxima do "eu", o díspar (adoro essa palavra). Eu, como Maggie, também gosto de viver o que acontece comigo. Me afeto. No afeto, no desafeto, no nada. Gosto sim da entrega de viver o que acontece comigo. E sei que leva tempo e eu tenho tempo, o tempo que eu tiver. Lembrei-me daquele quase tango bonito do Fred Martins e ufa que o usarei para terminar um tanto abruptamente essa prosa sem caminho aparente de fim e me levar para outra (ir)relevância logo ali. "Eu tenho o tempo do mundo, mundo afora".
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Rádio Plutão
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