Método
Tarde de sábado. Li apenas 10 páginas do Édouard Louis e tive que parar. Parei porque o céu lá fora mudou de cor de um jeito que a cor da página aqui dentro mudou também, me puxando para fora da história e de volta para meu quarto. Levantei, acendi a luz, ouvi trovões. Escancarei a janela antes de fechá-la só para sentir o vento forte e as primeiras gotas de chuva no rosto. Inspirei bem fundo e deixei sair pela boca o que sobrou da raiva que amanheceu comigo. Nada gritante, raiva quase corriqueira, nada nova. Aquela que vem quando minha necessidade de controle é cutucada. Quando o outro se demora no que para mim é urgente. E às vezes o tempo nem é necessariamente relevante, pode ser um lance que tanto faz se eu desenrolar de fato agora ou um teco depois, mas ter que depender do outro me perturba, me cresce o bico. Talvez por isso eu goste tanto do meu trampo, pois ali sou eu em todas as etapas do processo, da primeira à última. Controle. Me orgulho e aplaudo e enalteço esse traço em mim? Claro que não. Tento lidar com ele. Sem ignorá-lo, sem fingir que ele não existe. Tento lidar com ele. Reconheço a dificuldade minha, converso com a Larissa (que sabe bem do modus operandi) e me permito sentir a pequena ou grande raiva até ela sentir vontade de passar. E aí vem a calhar se o céu fechado em cinza escuro e a falta de luz me tiram do livro e me levam à janela. Para esvaziar no vento apertos de dentro. Mas devo acrescentar que a raiva em questão foi mais fácil de passar não só por mérito do meu autoconhecimento e do céu. O impasse prático que cutucou meu vespeiro foi resolvido com desfecho que contemplou todos os envolvidos. Houve estresse, desgaste, mas cada um entendeu o lado do outro e cedeu um pouco para achar saída comum. Ao invés de queda de braço, vitória e derrota, achamos entendimento, coisa rara entre nós nos últimos anos. Esse sentimento bom, cujo nome ainda não sei mas que rima com equilíbrio enfim, também se fez presente no peito e no vento.
Ok, agora depois do sentido organizado na escrita, posso voltar ao livro que traz o tema como título. Mudar: método. Diga-me aí, Édouard Louis.
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