quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Ele, Ernest, e Eu

Segundinha e eu voltando da academia com chuva forte, sombrinha manca e vento frio. Embaixo de um bloco, estava uma senhorinha elegantemente agasalhada, cachorro sentado ao lado, lendo, ói só, o mesmo livro que eu havia começado na noite anterior, só que em língua outra. Dei um boa noite em sorriso e falei bem dele. Ela disse um "Ele é meu caso de amor, minha jovem" e também sorriu. O cachorro nada fez. Nem me viu. E segui leve para a noite de prosa e ar retrô que me aguardava.
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Mil vezes Clarice

Medo da Eternidade
"Jamais esquecerei o meu aflitivo e dramático contato com a eternidade.
Quando eu era muito pequena ainda não tinha provado chicles e mesmo em Recife falava-se pouco deles. Eu nem sabia bem de que espécie de bala ou bombom se tratava. Mesmo o dinheiro que eu tinha não dava para comprar: com o mesmo dinheiro eu lucraria não sei quantas balas. Afinal minha irmã juntou dinheiro, comprou e ao sairmos de casa para a escola me explicou:
- Tome cuidado para não perder, porque esta bala nunca se acaba. Dura a vida inteira.
- Como não acaba? - Parei um instante na rua, perplexa.
- Não acaba nunca, e pronto.
Eu estava boba: parecia-me ter sido transportada para o reino de histórias de príncipes e fadas. Peguei a pequena pastilha cor-de-rosa que representava o elixir do longo prazer. Examinei-a, quase não podia acreditar no milagre. Eu que, como outras crianças, às vezes tirava da boca uma bala ainda inteira, para chupar depois, só para fazê-la durar mais. E eis-me com aquela coisa cor-de-rosa, de aparência tão inocente, tornando possível o mundo impossível do qual já começara a me dar conta. Com delicadeza, terminei afinal pondo o chicle na boca.
- E agora que é que eu faço? - Perguntei para não errar no ritual que certamente deveira haver.
- Agora chupe o chicle para ir gostando do docinho dele, e só depois que passar o gosto você começa a mastigar. E aí mastiga a vida inteira. A menos que você perca, eu já perdi vários.
Perder a eternidade? Nunca.O adocicado do chicle era bonzinho, não podia dizer que era ótimo. E, ainda perplexa, encaminhávamo-nos para a escola.
- Acabou-se o docinho. E agora?
- Agora mastigue para sempre.
Assustei-me, não saberia dizer por quê. Comecei a mastigar e em breve tinha na boca aquele puxa-puxa cinzento de borracha que não tinha gosto de nada. Mastigava, mastigava. Mas me sentia contrafeita. Na verdade eu não estava gostando do gosto. E a vantagem de ser bala eterna me enchia de uma espécie de medo, como se tem diante da idéia de eternidade ou de infinito.Eu não quis confessar que não estava à altura da eternidade. Que só me dava aflição. Enquanto isso, eu mastigava obedientemente, sem parar. Até que não suportei mais, e, atravessando o portão da escola, dei um jeito de o chicle mastigado cair no chão de areia.
- Olha só o que me aconteceu! - Disse eu em fingidos espanto e tristeza. - Agora não posso mastigar mais! A bala acabou!
- Já lhe disse - repetiu minha irmã - que ela não acaba nunca. Mas a gente às vezes perde. Até de noite a gente pode ir mastigando, mas para não engolir no sono a gente prega o chicle na cama. Não fique triste, um dia lhe dou outro, e esse você não perderá.
Eu estava envergonhada diante da bondade de minha irmã, envergonhada da mentira que pregara dizendo que o chicle caíra na boca por acaso.
Mas aliviada. Sem o peso da eternidade sobre mim. "

Clarice impávida Lispector
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Por que amo a Fal

"Você quer saber o que aconteceu? Rá, foi assim: os gatos derrubaram minhas garrafas de licor de murano, coleção da vida inteira, e sabe como pobre coleciona, né? Uma-por-uma. Bão, estamos lá limpando aquela melequeira, aí ele falou "Pronto, começamos a campanha Eu Agasalho 2003", aí eu tive um acesso de riso daqueles de doer a barriga. Fui me equilibrar segurando na parede, eu tenho milhares de quadrinhos com fotas de família na parede, e rasguei a lateral da mão por dentro (assim, perto da palma). Aí tinha sangue, caco de vidro, licor, gato, gata, cachorro, nós dois abobados. Mas ele desabobou rápido, me fez sentar. Escorria sangue, eu chorava alto e você sabe cumé vizinho de pobre? O meu vizinho, o Manolo, ouviu barulheira, grito, choro, falou "uia, os gordo tão se espancando", tocou a campainha, viu a cena, buscou a maleta e deu doze pontos na minha mão. Detalhe, nega: o Manolo é veterinário. Aí eles limparam a melequeira, embrulharam minhas pobres garrafas em bilhares de jornais pro lixeiro não se machucar, limparam o resto; e a minha prateleira antigatos, que não é antiporranenhuma, tá lá, vazia, uma tristeza. Minha mão está boa, não inchou e só dói um pouquinho, os dedinhos se mexem, o Manolo é um grande veterinário. Os gatos estão trancados na área de serviço, não quero olhar na cara deles por muitos e muitos anos.
Fal mefazliteralmentechorarderir Azevedo (O Nome da Cousa)
Falzita, florminha, doçura muita é doçura sua... com todo o açúcar e o sal que as palavras podem conter. Você merece tudo!! Merece um mundo inteiro em caixas de pequenasgrandes delicadezas. Você merece, meu bem. Beijonutellacomletra =)
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Tricô literário com Seu Bernardo em: drops e bukowski

"Eu tava tentando não abusar do terapia express, pois afinal tem sempre gente que precisa mais do q eu. Mas hoje não deu. Hoje faz 2 anos que eu terminei um namoro de 4 anos. O fedaputa já teve 347.498 namoradas. E eu? Hahaha...meus dias se dividem naqueles em q eu penso nele todos os segundos e aqueles em q eu penso só umas três vezes por dia. E ainda tenho q ouvir pessoas dizendo q "eu não me abro", que eu "não deixo rolar" e q "isso passa". Como se não bastasse, o encosto ainda quer "ser amigo". E mesmo eu tendo cortado qualquer tipo de contato, me liga bêbado. Ãhn? Se ele ainda gosta de mim? Não, é doente mesmo. Ou melhor: é homem. Definitivamente eu fiz guerra de miolo de pão na Santa Ceia. Fui aquela q gritou "não amarra, não! Prega". Ou deve ser Plutão q foi rebaixado de planeta e traz esse caos a minha vida. E ainda querem q eu vote domingo? Ah, não... Eu tb quero ver TV manchete. E Bambalalão, que passava na Cultura. " Carrie, a estranha (roubado dos arquivos idos do Drops da Fal)

"Mulheres: gostava das cores de suas roupas; do jeito delas andarem; da crueldade de certas caras. Vez por outra, via um rosto de beleza quase pura, total e completamente feminina. Elas levavam vantagem sobre a gente: planejavam melhor as coisas, eram mais organizadas. Enquanto os homens viam futebol, tomavam cerveja ou jogavam boliche, elas, as mulheres, pensavam na gente, concentradas, estudiosas, decididas: a nos aceitar, a nos descartar, a nos trocar, a nos matar ou simplesmente a nos abandonar. No fim das contas, pouco importava; seja lá o que decidissem, a gente acabava mesmo na solidão e na loucura."
Charles Bukowski
=)
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Um Pessoa para rosí, que tanto o sempre
"A mim ensinou-me tudo.
Ensinou-me a olhar para as coisas.
Aponta-me todas as coisas que há nas flores.
Mostra-me como as pedras são engraçadas
quando a gente as tem na mão
e olha devagar para elas."
Fernando Pessoa
beijograçaempedra, queridinha...
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Lalous
Coisa boa esse dia...
Conquista sua, mérito seu. Alegria nossa!
Amo-te, hermanita...
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Escolhinha
A mão quer (e não quer) escrever a palavra que não deve (e deve) cair no papel. Porque há (e não há) um tom ridículo nessa quasemelancolia pelo não vivido (mas vivido). Posso (e não posso) falar sobre o que existe ainda (e não mais). Ouço aquela que diz (e não diz) o que é (e é). O pouco (muito), o quase (sem). Pronto. Ainda e não. Sem parênteses. Ponto.

9 comentários:

  1. 'Já lhe disse - repetiu minha irmã - que ela não acaba nunca. Mas a gente às vezes perde'

    receita delicada para muitas coisas na vida - perdeu o gosto, deixa cair...
    ah clarice...ah poetIZA...
    só vcs para me trazerem encantamento nessa quintacinzaensolarada!
    beijos minha querida.

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  2. quase me afoguei de deleite nessa enxurrada poética! quanta inspiração! pra criar, compartilhar prazeres...

    obrigado e parabéns.

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  3. ah, clarice... olha o medo nos olhos, rompe com o eterno e se entrega ao desemplano... ela é sensacional, rosí querida...sensacional!
    e que bom que seu dia abriu frestas pro encantamento... que bom...
    beijobala!

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  4. Felipe... e o que seria de nós sem a água boa da palavra... ela, que tempera o todo em seus pequenos pedaços...
    Te agradeço também pelas suas! =)

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  5. Izaaaa... :) parabéns... adorei o blog (A rosi que me mostrou...) muito fofo... tive bons momentos de sorrisos contidos no trabalho... em casa leio mais... ai de forma mais descontraida...

    Bejutrespontinhos...

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  6. Seja muito bem-vindo,Júnior! Que bom que se sentiu em casa aqui no MTA... leia sim,comente e contribua! =)
    beijo p'c!

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  7. Oi Iza!
    Tô de volta!
    Obrigada pelos parabéns!
    É mesmo muita felicidade no coração!
    Beijos com amor

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  8. uma alegria só, meu bem!!
    sua determinação é fonte de inspiração pra mim e pra todos que te conhecem...
    beijostodos, hermanita querida!

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  9. Aff que Júnior é vc, Pequíííí!!! hehehe...
    beijo!

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