segunda-feira, 22 de dezembro de 2025

Outra
De repente a vida ficou mais simples. Facilmente respirável. Gostaria de até ter uma história mais interessante pra contar, dizer que foi a partir de um evento, um momento marcante, um algo específico e significativo. Mas não foi. Foi uma tarde que virou noite e imprimiu em mim uma tranquilidade melódica, uma clareza inexplicável, que não é da ordem das palavras. Fui dormir tomada. E acordei para o mesmo mundo mas com outra eu, uma mesma outra. Passei o dia fazendo coisas ditas banais só que de um jeito diferente, fazendo com gosto. De noite bebi vinho e ouvi e falei e observei detalhes e me pus quieta e gargalhei junto. Muito. A chuva que caia por horas parou bem no instante de ir embora e caminhamos nós 5 por entre árvores que pareciam de outro lugar que não aquele. Riso bom, cheiro de verde. E já no carro, a caminho de casa, tive a certeza de que a vida tinha simsim ficado mais simples. Com gosto. Com quereres outros.
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Cria que crê
brincando
 


domingo, 14 de dezembro de 2025

"Não sei. Leia na minha camisa."



sexta-feira, 12 de dezembro de 2025

Pequena grande lista de coisas que salvam

a fila da lista

As mulheres ao redor 

Amor que vem na forma de prosa, regada a chá de gengibre com limão, pão de milho quentinho e biscoito pitico de polvilho que mais parece uma gravata borboleta arredondada e não só é ridiculamente gostoso em sabor como gostoso também no jeito de comer

Dançar mudernagem da Ellen Oléria no banho

Música. Todas. As antigas, as novas, as de sempre

O reparação histérica dessa semana com o Alexandre Coimbra 

Dia de chuva com lampejos de sol

Azcria deixando fila de bichinhos fofos assim, de surpresa, para que eu tenha um bom dia de trabalho 

Notícias da Nina

Treinar pesado e depois fazer 15 minutos  de escada ouvindo Talking Heads até encharcar de suor

Áudios manifestando saudades 

O acaso

Assistir ao O filho de mil homens e ter um cadinho da esperança na humanidade restaurada

Entender o teatro e escolher não entrar em cena

Ver em sonho o arremate do que eu passei o dia elaborando 

Ser sincera e assumir que, agora, tenho muito e nada a fazer e pouco pra dar

Estar consciente. Consciente

Parar                por um instante sem tempo contado                e seguir 



segunda-feira, 8 de dezembro de 2025

Diária, querida, como é mesmo que se soletra "saída"?

Acordei querendo férias. Não do trabalho; poderia seguir trabalhando até sozinha pela equipe inteira semana afora sem problemas, sem problemas. Mas queria férias de todo o resto. Breves ou longas, não sei. Mas sei que esse descanso que queria, do mundo e da vida, é inalcançável e impraticável no real, dentro da minha escolha diária de estar e permanecer viva. Mas queria um pouquinho. Queria um grande e intenso nada dentro da minha calça de flanela xadrez, da camiseta rosa de que não gosto e das minhas meias de nuvem abraçantes de pés. Queria esse nada. Ver ninguém, falar com ninguém. Trancar o celular desligado na gaveta e me entregar ao nada. Por que essa última semana foi um mar revolto de TANTO, assim, em letras garrafais, que preciso de descanso. E não se engane, diária, tive um fim de semana gostoso de sorrir em maratona festiva com pessoas que amo, vendo nossas crias, também juntas, também entregues e felizes no estar ali. Mas, de uma outra forma, me sinto esgotada. 
A verdade é que o que aconteceu com Ela (é assim que irei chamá-la) mexeu comigo de um jeito que me faltam metáforas para explicar. Um rasgo? Uma gigantesca lente de aumento tornando insuportável o tamanho do já claro e explícito? Não sei. Não foi na minha pele, eu não estava lá, não foi comigo. Mas é como se fosse. Por que foi. Não foi, mas foi. Por que entendo não só no raso do racional. Entendo no íntimo, na subjetividade e, no reverso, no que há de mais coletivo e humano em mim e nEla. Entendo num sentido conhecido, que já fazia sentido, mas por efeito do choque ganhou outros contornos. Expandiu seu contorno num clarão de obviedade que beira o insuportável. De novo, a palavra insuportável. E como se calar diante disso tudo, do acontecido e do além dele? E por que se calar? Por que essa regra? Por que não trazer pra realidade o que é realidade? O que fazer com a brasa, a revolta (a revolta!), a necessidade de grito? O que fazer com o engasgo, o medo, o choro contido? O que fazer com o absurdo senso de inadequação normalizado, incentivado e socialmente instituído? Como trazer à tona a consciência do macro e do micro se ficamos aqui mergulhados na regra do não dito? Não sei, não sei. E sei ah como sei do silêncio querido, das suas propriedades curativas, da importância salutar dos hiatos. Sei. Mas não consigo conceber o silêncio como chão para a revolução. Pra mim, o terreno fértil pra revolução é a palavra. A palavra compartilhada nos torna mais conscientes, aponta caminhos para mudanças concretas no eu e no nós, nossos nós. E meu anseio por quietude me traz ainda mais a certeza de que é hora de não se aquietar. É hora de pular as cercas e enfrentar os cães. Mudar quase tudo. Pagar os preços todos. Mas como se conformados, sozinhos no silêncio? Não entendo. Mas entendo, feliz ou infelizmente, que minha exaustão de agora vem de fato dessa junção coletiva de silêncios conformados. Estou cansada do som oco do não grito. Quero o nada por querer tudo. E por, sozinha, não ver saída. 

terça-feira, 2 de dezembro de 2025

Miniconto sobre a falta 

Ela soltou sua confissão e chorou. Chorou num misto de alívio e vergonha, como quem não quer mas quer puxar de volta a água já escorrida por entre os dedos. Assenti com os olhos, estendi minha mão em silêncio e consegui lê-la pelo tato. Vi um mar de faltas cercado de excessos por todos os lados, o avesso de uma ilha sendo ilha ainda assim. Quis explicar que entendia bem aquela dor, aquela humanidade, mas a mim não cabiam as palavras. Mergulhei no mar dela então, sofri junto. Minha tentativa, meu jeito, minha intenção de não deixá-la só. E só.