sexta-feira, 21 de fevereiro de 2025

 Hã, biloute?

*** gosto de dizer que quem tem filho pequeno não tem plano, tem intenção. Mas a verdade é bem mais ampla que isso. Quem está vivo não tem plano, tem intenção. É claro que a gente planeja, estrategiza (isso é um verbo válido, produção?), sonha, deseja. Mas uma mudança, às vezes externa e que foge completamente ao seu controle, chega e lá vai você se perder e recalcular a rota em condições ridículas de temperatura e pressão. Ridículas. Ridículas. Ridículas.

*** uma semana horrenda, horrenda, horrenda, horrenda. Tão horrenda que dá preguiça de caçar adjetivos melhores. Só repito os mesmos. Mas te digo, há uma vantagem de estar nesse ponto, no lustrar o fundo do poço com a cara. Pra mim, essa é a hora para as pequenas ousadias que normalmente me deixariam receosa, nervosa, sei lá. Eu tô tão ridiculamente (ói a repetição) na merda que eu só vou. Qualquer situação desconfortável vai ser nada perto do que já está rolando. Então vou. 

*** minhas incríveis amigas não têm o poder de me tirar da situação horrenda - completamente fora do alcance delas- mas elas vêm me visitar no fundinho horrendo, limpam minhas bochechas, fazem chá, trazem Van Goghs, leem pra mim, falam delas, gargalham, brilham ideias de estrada e mato. Incríveis. Incríveis. Amo loucamente. 💛

 Retórica 

Não é cortante a certeza de que tudo não vai ficar bem? De que tudo não vai dar certo no final?

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2025

Trecho esparso sobre o amor

Eu converso contigo. Ocasionalmente. Acho súbito, não entendo bem o por que, mas converso com você. Assim: prosas eventuais, imaginárias, com pausas reticentes nas frases em que eu diria seu nome. Eu não conheço seu nome. Conheço sua capa, sua voz e sua vibe que passa, transita perto. Conheço seus bons dias, como você me olha e o efeito do seu olho no meu. Isso conheço. E tem algo ali, um chamativo, uma intensidade presente e, não sei, talvez contida. Não sei. Um algo que talvez toque algo adiado em mim.

domingo, 16 de fevereiro de 2025

Pele

Bonito o caráter expansivo da arte. O filme fala do livro que cita o espetáculo que menciona a autora que escreve sobre o quadro que te lembra a série na qual rolou aquele som, aquele som. É meio o poema do Drummond - "João que amava Teresa que amava Raimundo..." - e também na "Quadrilha" da arte os elementos diversos seguem entrando e se movimentando pela nossa história. 

Ouvi Letuce pela primeira vez em uma peça de teatro. Tocou "Potência" e eu fiquei simplesmente alucinada, memorizando partes para depois ir sedenta descobrir (e amar) que banda era aquela. Descobri Elizabeth Bishop lendo um artigo sobre Drummond e é dela meu poema favorito na vida. Daí ontem aconteceu algo do tipo. Assistia ao excelente, "Boa sorte, Leo Grande" quando entrou em cena uma cena de dança (ahh, as cenas de dança) e lá fui eu quase me desconectar do filme para mergulhar no som. Voltei a cena várias vezes, me levantei, dancei junto até sentir bem o que havia para sentir ali. Fiquei em dúvida se já conhecia a música porque a conhecia ou se só parecia ser conhecida pelo jeito macio de encaixar em mim. Viajei sem pressa naquela onda prazerosa até que enfim reconheci a voz. Brittany. Dois minutos de busca pelos sons do Alabama Shakes e lá estava ela , Always alright, me esperando. Veio certeira ao meu encontro para fazer casa no meu repeat. Através do filme. Acho isso bonito demais, esse encadeamento que a arte faz, esse juntar colorido de missangas no fio de um colar (oi, Mia Couto). Colar que desconhece fim e vai dando voltas festivas no pescoço, se espalhando, ocupando espaços do corpo. A arte compondo minha pele. Não me canso de achar bonito.

Ouça aqui

P.S. : Just in case you walk by here, there is a US tour going on, DC in september. Do yourself and the universe a favor and go, por favor. Obrigada, de nada. ;)


quinta-feira, 13 de fevereiro de 2025

Impecável
"Tudo em linha reta
tudo combinado, previsto, controlado Dizia nunca ter sentido nenhuma inveja
Não se permitia nenhuma gula 
e engolia só a ira 
Preguiça, jamais 
Luxúria, nem pensar 
E de tanto temer o fogo 
congelou todos seus desejos 
Com vergonha do orgulho 
rebaixou suas alegrias
e o sorriso alheio lhe ofendia 
Mas nós, pecadores, que você tanto repudia e deseja 
te convidamos a brincar conosco nesse lamaçal 
Vem 
Talvez tenha chegado a hora de não ser mais tão impecável." 
Geni Nuñez

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2025

Conversê

I: O Irineu existe???? 😱😱😱 Chocada

F: eu tava quase morta naquela padoca

 I: Ele nem sonha que é uma celebridade, tadico...

F: né, eu me pergunto se tenho direito de separar aquele homem da celebridade que ele merece

I: hahaha! Toda uma vida paralela, poética, cheia de melindres. E ele lá, só comprando pão.

F: ele tava tomando uma cynar

eram 7h15 da manhã

terno branco com camiseta branca

cynar

no balcão

eu sei que era ele

I: Joguei cynar no Google e GARGALHEI

Só pode ser ele, falzuquitcha

F: eu sei que era

I: E a gente só sonha em chegar lá, né? Desfilando elegância e cynar na padoca às 7:15 da manhã 

Algo a se sonhar

Um quase propósito na vida

Hahaha

Até lá você escreve sobre fins de mundos e eu escrevo trechos esparsos sobre o amor inspirados em 1- caras que eu não conheço e 2- caras que eu preferia não ter conhecido. Até a gente, enfim, pedir pro seu Manoel dois aperitivos de alcachofra no balcão da padoca. É um plano.

F: HAHAHAHAHAH ❤️ ❤️ liamo

I: Te amo, meu bem ♥️

terça-feira, 11 de fevereiro de 2025

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2025

 Com elastano

Rigidez. Quem cresceu em famílias que tinham o rigor como cartão de visita sabe bem o quanto esse tópico é sensível se escolhemos olhar para ele com o cuidado e a reflexão que merece. Por que se por um lado o rigor pode abarcar algum conforto, trazer regras firmes e com elas algum senso de segurança, por outro, parece inescapável que ele caia na intransigência e acabe flertando com a arbitrariedade.

Sei que regras são importantes e que viver a vida sem elas, solta na mão do palhaço (adoro essa expressão), pode nos afundar num caos completo. O lance, então, a meu ver, é se engajar no exercício hercúleo de ir buscando um equilíbrio entre o "dado como dado" e o "ó, pode ser diferente". Aí que dia desses flexibilizei uma regrinha minha (calcada em embasamento prático e pessoal, devo dizer. rs) e me senti bem feliz com a minha atitude. Ahh, por que deu certo, saiu como esperado, Izabela? Não. Êxito zero na empreitada, meu camarada. Uai, feliz "casdiquê" então? Por que eu me questionei, eu não encarei o diferente com olhos de estranheza e repulsa imediata. Eu trouxe o diferente para conversar com o que eu tinha como "certo". E, nessa conversa, eu vi brecha para maleabilidade, brotou um "vai que..." e me permiti agir fora do que tinha preestabelecido. O resultado não foi bom, mas a experiência foi boa. E não só pelo precioso exercício em si, de refletir e olhar além (oi, Nina), mas porque em outras situações já vividas flexibilizar deu super certo e boto fé que em outras que virão também dará. E está tudo bem se der ruim vez ou outra. O que eu não quero é cair no engessamento. Na rigidez que, no fim das contas, nos cega. Cega tirando nosso poder de escolha consciente e, acredito, nos deixando mais propensos a julgar negativamente o diferente, só por que não se encaixar no nosso jeito. A rigidez joga a gente no automático. E o automático é quase burro, fechado para mudanças. Fico genuinamente feliz por eu ter me aberto, ter me arriscado. E termino esse texto um tanto nada organizado citando os adoradíssimos Porcas Borboletas. Sigo sem medo de me molhar.

" Eu me fodi

   Tranquilamente

   Tô nem aí, eu sigo em frente

   Porque agora nessa vida

   Eu pretendo melhorar

   Se chover eu tomo chuva

   Com vontade de molhar."

"Infelizmente" é som delícia da banda Porcas Borboletas.

https://open.spotify.com/track/3lZi9haOBepJfyKrxUMTn8?si=VGeNdB-lRkWP0EWvijQLZA


quinta-feira, 6 de fevereiro de 2025

It takes two to tango


Adoro essa expressão. E não só pela sonoridade, esse encadeamento poético de Ts e o que faz a boca ao pronunciá-los assim seguidinhos. Adoro porque ela traz algo da dinâmica da dança para a dinâmica da vida. Pois assim como no tango, relacionar-se requer movimento, sintonia, presença. Requer incorporar (literalmente) o som e ter alguma dose de confiança para se mover de acordo com as esperadas mas imprevistas tempestades e calmarias, encaixes e desencaixes. Lembro bem dos meus tempos de dança de salão que, para as outras aulas -forró, salsa, samba, bolero- bastavam sapatos e roupas confortáveis. Para o tango não. Para o tango era salto, saia, collant, cabelo em coque, postura e parceria. Eram comuns exercícios com os olhos fechados ou vendados e danças inteiras com as luzes apagadas, no quase completo escuro. Era um exercício de entrega e presença. Sintonia. Mesmo que cada qual com seu passo diverso. E não vejo como estar presente se a dança não te move de fato. Se a música não te apetece, o ritmo não conversa contigo e os passos não te prendem em liberdade pelo salão, não há presença. Há desconforto. E ninguém tem que gostar da mesma dança ou querer dançar. Há aí uma infinidade de ritmos outros, possibilidades outras que podem te fazer mais sentido. Inclusive danças deliciosas que prescindem de parceria. Mas dança de dançar junto é com dois presentes. It takes two to tango. E às vezes na vida a gente é tão pouco atento que dança sozinho estando com outro. Ou seguem os dois em desgosto e desgaste tentando achar ritmo comum onde não existe mais. O entendimento do que é amor, amizade, respeito, responsabilidade, liberdade, ética relacional pode ser completamente diverso e naturalmente não vai encaixar em passo. Não há dança. São pés arrastados em tropeços contínuos. O tango é complexo de se dançar e é divino. Relacionar-se também. Mas precisa de dois. It takes two to tango. Hoje consigo enxergar isso com clareza e me sinto em treinamento no exercício de trazer essa percepção para a prática. Mas confesso que tenho pés e mãos e corpo inteiro com cicatrizes e uma ou outra ferida ainda aberta de tanto que me arrastei e me contorci pelo salão. Me machucava tentando encaixe em dança ruim pra mim ou tentando convencer o outro a dançar, só para garantir a ilusão de ser um par. Não mais. Talvez só agora eu esteja realmente aprendendo a dançar.


quarta-feira, 5 de fevereiro de 2025

Primeira pessoa


Eu

Eu eu eu eu

Eu eu eu eu eu eu

Eu eu eu

Eu eu

Eu eu eu eu 

Eu eu eu

Eu eu eu eu eu

Eu


Isso não é poema.

terça-feira, 4 de fevereiro de 2025

 Oníricos n°2


Entrei pela porta sem tocar a campainha e não me espantei com a quantidade de gente. Era a sua casa, mas não a casa que eu conheço. Da sala fui para uma varanda comprida que não existe e, a partir daí, lembro só de uma coisa ou outra. De brisa fresca, cortinas vermelhas, luz de fim do dia, burburinho gostoso de encontro festivo e de um bolo de chocolate no centro da mesa. Imaginei ser o aniversário da sua cria, pelo tanto considerável de criança espalhada ali. Até que você segurou meu braço, polegar em movimento, e disse meio de lado sem me olhar no rosto: "não vai embora, tá". Também sem olhar, mas sorrindo, respondi um macio "talvez". E ali ficou clara a sua questão em relação a quem eu fui e a minha tranquilidade em não ser mais. Acordei já fora do sonho e, ao abrir a rede social, lá estava você: vela soprada, bolo, comemorando seu aniversário na noite anterior.


 Hã, biloute?


*** Eu, que sigo firme me equivocando em relação às coisas, tinha pra mim que a blogosfera era agora esse campo em ruínas, inabitado, de folhas secas em movimento e vento uivante. Ledo engano. Há aqui gente que lê, que escreve e segue explorando as variadas trilhas palavreiras. Surpresa boa. Caiu por terra meu propósito primeiro de fazer daqui um diarinho secreto, mas tá valendo.

*** "Chega de passar a mão na cabeça de quem te sacaneia", Barão Vermelho cantou a pedra nos idos anos 80. A gente cantava inteirinha, dançava nas festinhas, colocava no LP pra rodar, mas só entendeu como possibilidade real e trouxe pra prática lá pelos 45 de idade. E quando eu digo "a gente", eu digo "eu".

*** Ch. talvez será lembrado com o cara que chamou Nietzsche de juvenil. E não por que eu concorde ou discorde (faz uma vida que eu não leio o distinto senhor), nem por que o comentário abriu toda uma prosa sobre como nós, indivíduos e nação, temos dificuldades em lidar com criticidades, mas por que a mí me gustan as pequenas ousadias, esses quase atrevimentos.

*** Geni Nuñez, no podcast O Estranho Familiar, brilha, brilha, brilha e brilha na sua fala. E termina lendo um poema dela que pelamordadeusa. Anotei no caderninho e leio todo dia. Todo dia. Putz que divino.

*** "O hábito torna suportáveis até as coisas assustadoras". Questões de português pra concurso sabem dos paranauês.

*** Escrevendo hã, biloute no MTA e ouvindo Cícero. Parece 2010 all over again, mas né não, né? :)

sábado, 1 de fevereiro de 2025

 "E pareceres contínuo"


Assisti a esse vídeo do Eddie Vedder em que ele lê um trecho escrito por Damien Echols antes de cantar Bob Dylan. E sim, o tempo não existe. Mas existe. Assim como o vento (eita, ói "O tempo e o vento" aí), que não possui um corpo visível mas a gente o reconhece no contato com as folhas que voam, no frescor que bate na nuca, no cabelo que bagunça como que por pequeninas mãos; o tempo também se faz material nas coisas. Eu o vejo imprimindo linhas no meu rosto, nas crianças que voltam diferentes a cada 4 dias com o pai, na mãe que virou minha filha. Vejo o tempo palpável na construção dos afetos, em abraços e beijos que se transformam. Também o vejo na concretude dos silêncios, no sentido de falta que vai se descolando de nós e some, mas nunca em um passe de mágica. Leva tempo. O tempo existe. E não existe, Damien tem muita razão, o tempo é só truque. Só existe o agora. Porque o que foi e o que virá são fugidios e só o agora é real no nosso campo de ação. Agora.


"Uma coisa que eu adoraria ter é uma ampulheta ou uma coleção delas. Algumas que medem minutos, outras que medem horas, outras que medem o dia inteiro. E relógios de pêndulo e relógios de bolso. O que mais gosto sobre o tempo é que ele não é real, está todo na cabeça. Claro que é um truque útil se você quer encontrar alguém em um lugar específico do universo para um chá ou um café, mas é tudo que ele é, um truque. Não existe passado, ele só existe na memória. Não existe futuro, ele existe apenas na nossa imaginação. Se nossos relógios fossem verdadeiramente precisos, a única coisa que eles diriam é "agora"."

Damien Echols